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Vídeo: Instituto que elegeu jumento como melhor prefeito, premiou políticos de Teixeira e região

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08/08/2018 - 15h45Por: Sulbahianews

Um jumento como um dos cem melhores prefeitos do Brasil? Para ser eleito, o animal chamado Precioso não baixou decreto nem cortou pastos; ele só teve que pagar a uma das empresas que vendem diplomas de melhor gestor para prefeitos, vereadores e secretários municipais.

Uma reportagem especial de Giovani Grizotti foi ao ar no último domingo, 5 de agosto, no programa Fantástico da rede Globo de Televisão, e mostrou como o negócio funciona e o comércio de diplomas de mérito para vereadores, prefeitos e secretários municipais será investigado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Os políticos são suspeitos de usarem recursos públicos para conquistar as premiações. As empresas que fornecem os prêmios são a União Brasileira de Divulgação, ou UBD, de Pernambuco, e o Instituto Tiradentes, de Minas Gerais. Juntas, as duas instituições promovem até 20 premiações por ano.

Para mostrar a falta de critérios na hora de conceder esse tipo de premiação, a reportagem do Fantástico conseguiu negociar a compra de um diploma para um jumento – o jumento Precioso. Para mostrar como a UDB vende prêmios, o repórter da RBS TV mandou uma mensagem para o celular da empresa.

Quando começa a conversa, o repórter se apresenta como assessor de prefeituras gaúchas. Em pouco tempo, fecha a compra da premiação do “prefeito Precioso” por R$ 1.480. Na véspera do evento da UBD em Recife, a reportagem entrega o dinheiro ao dono da empresa, Fernando Vieira da Cunha, e recebe a medalha e o diploma.

O Precioso é um “gestor nota 10”, classificado na pesquisa nacional de utilidade pública entre os “100 melhores prefeitos do Brasil”. A reportagem, então, apresentou o Precioso ao Fernando:

  • Repórter: O senhor emitiu um diploma em nome de um jumento, o jumento Precioso, bem na sua frente.
  • Fernando: Sim, sim. E o que é que tem?
  • Repórter: Mas, um jumento pode ser prefeito?
  • Fernando: Mas, você não mandou imprimir?
  • Repórter: Mas, um jumento pode ser prefeito?
  • Fernando: Pode, pode.

Nos eventos, os políticos recebem diploma de “vereador mais atuante” ou “prefeito mais atuante”. A maioria dos participantes desse tipo de evento usa dinheiro público para pagar pelas inscrições e também gasta diárias pagas pela prefeitura ou pela Câmara para ir às cerimônias. Fernando admite que o seminário usado como pretexto para entregar a premiação é apenas para disfarçar.

  • Fernando: Teve cliente que me pagou quase 5 mil, pô. Ele quis seis diárias. Aí, eu incluí na inscrição.
  • Repórter: Mas, a prefeitura paga?
  • Fernando: Paga.

Um levantamento do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul mostra que só no estado o Instituto Tiradentes faturou R$ 116 mil em 2016 e 2017, com três eventos. O Instituto até promove seminários juntamente com a entrega dos prêmios. Mas, o Ministério Público do Rio Grande do Sul acha que os seminários são apenas uma desculpa.

“É uma maneira de vender melhor o encontro, de maquiar, na verdade, a falcatrua que se esconde por trás e o conluio existente entre a empresa e o agente público. Esses eventos visam claramente à promoção pessoal do gestor, do agente público e, de outro lado, o lucro das empresas. Nenhuma finalidade pública”, declarou o procurador-geral de Justiça do Rio Grande do Sul, Fabiano Dallazen.

O Ministério Público já denunciou dois políticos gaúchos pelo uso de dinheiro público para pagar a inscrição nos eventos promovidos por uma terceira empresa. São eles Rafael Malmann, atual prefeito de Estrela, e o ex-prefeito de Mostardas Alexandre Galdino, ambos do MDB.

O procurador diz que não existem critérios para escolha dos melhores gestores do Brasil. “O critério é, sim, aqueles prefeitos que se dispuseram a custear com verba pública o lucro da empresa que promove esse falso evento”.

Falta de critério na premiação

Um exemplo da falta de critério é a escolha de Pedro Henrique Gross como o segundo vereador mais atuante de Terra de Areia, no ano passado. Só que, cinco meses antes da escolha, feita entre os dias 10 e 21 de outubro, Pedro não era mais vereador, ele tinha se licenciado da Câmara para ser chefe de gabinete do prefeito. O político não quis ir receber o tal prêmio. Se quisesse, teria de pagar R$ 578 de inscrição.

“Fiquei feliz, assim de imediato, de receber, de ser citado, mas confuso porque não estava na Câmara como vereador”, declarou Gross.

O porta-voz do Tribunal de Contas do Estado, Valtuir Nunes, relata que falta documentação: “A empresa, pelo que vimos, atribui o prêmio em decorrência de uma pesquisa telefônica feita aos eleitores da cidade. Que não é comprovada, não tem documentação de que isso efetivamente aconteceu, então, isso revela fraude”.

O especialista em gestão pública Aloísio Zimmer examinou os indicadores sociais das gestões premiadas pela empresa em todo Brasil e identificou problemas graves em áreas como saúde e educação. Assim, no contexto da fraude, Zimmer entende que a verba pública usada nesse tipo de evento não é o principal problema. O que preocupa, segundo ele, são as “fakenews” geradas como repercussão das premiações, especialmente em blogs e redes sociais, o que pode, inclusive, influenciar nas eleições.

“Cria-se uma narrativa e até mesmo uma implantação de falsas memórias no cidadão que depois será eleitor, porque o prefeito passa uma imagem de bom gestor, de protagonista das soluções mais importantes da cidade, de que ele é alguém capaz de melhorar a vida da população”, afirma.

Em nota, o Instituto Tiradentes diz que não comercializa medalhas e diplomas de mérito, nem certificados de participação em seus seminários e afirmou que, no caso do vereador Pedro Henrique Gross, a empresa encaminha correspondências às câmaras municipais solicitando a atualização dos dados dos vereadores em exercício.

Bahia

Após a exibição da reportagem no domingo, o Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia disse que vai lavrar Termos de Ocorrência para apurar a compra de diplomas e medalhas, por parte de prefeitos e vereadores.

“São vendidos por empresários espertalhões, a título de honraria, por suposto destaque na administração municipal ou desempenho nas câmaras em cidades do interior do Brasil”, diz um trecho da nota da assessoria.

O TCM vai instaurar processo para que prefeitos e presidentes de câmaras municipais devolvam aos cofres públicos os recursos gastos com a taxa de inscrição para a “cerimônia de entrega da honraria”, assim como os valores gastos de recursos públicos com diárias, hospedagem e transporte para o local do evento.

A decisão de instaurar a investigação para punir os gestores públicos baianos envolvidos foi tomada pelo presidente do TCM, conselheiro Francisco de Souza Andrade Netto. Ele destaca que no último domingo, o Fantástico denunciou uma verdadeira indústria de venda de homenagens que existe no país que atrai – e em alguns casos ilude – gestores públicos de municípios de todo o país.

Numa apuração preliminar feita pelo TCM, 26 prefeituras e 30 câmaras municipais baianas pagaram pelas distinções negociadas pelas empresas “União Brasileira de Divulgação – UBD” e “Instituto Tiradentes”, nos anos de 2017 e 2018. Os diplomas e medalhas custaram um total R$92.983,00.

O “Instituto Tiradentes” foi mais ativo, arrecadou R$80.833,00 nos municípios – 13 prefeituras em 2017 e 26 câmaras no mesmo ano. Em 2018, vendeu prêmios para 12 prefeituras e 10 câmaras. Já o UBD teve como clientes oito prefeitos em 2017 e dois em 2018. E ganhou R$12.150,00.

Em Teixeira de Freitas, o vereador Agnaldo da Saúde, hoje presidente da Câmara, recebeu em maio de 2014, o título de vereador mais bem avaliado em uma pesquisa feita pelo Instituto Tiradentes. Assim como denunciou a reportagem, o instituto afirma que realizou entre os dias 17 de março e 4 de abril uma pesquisa via consultas telefônicas aos munícipes, com a finalidade de que fosse identificada a aceitação pública dos vereadores de Teixeira de Freitas.

Diante da avaliação, Agnaldo da Saúde foi convidado a participar do 80º Seminário Brasileiro de Prefeitos e Vereadores e Procuradores Jurídicos, realizado no dia 16 de maio do mesmo ano, no auditório do Hotel Intercity Premium, em Salvador, para ser homenageado com a medalha Tiradentes. O fato, inclusive, foi noticiado pela imprensa local na época.

O título de 2014 concedido ao teixeirense não está incluso na apuração preliminar do TCM, que analisou, até o momento, apenas as honrarias concedidas entre 2017 e 2018.

Já em 2018, receberam o mesmo prêmio pelas atuações em suas respectivas funções, também pelo Instituo Tiradentes, o secretário de Saúde de Medeiros Neto, Alex Serapião, o prefeito de Lajedão, Humberto Côrtes, o “Betão”, e o Itamar Siqueira Junior (PDT), do município de Mucuri, todos os supostos seminários para as premiações ocorreram em Salvador.


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