Ensaio
fotográfico

Liberdade e afirmação da identidade negra resumida no ensaio do grupo Crespxs e Cacheadxs

03/05/2015 - 15h01Por: Sulbahianews/Petrina Nunes

Para quem está acostumado a ver modelos fotográficas altas, magras, brancas e de cabelos lisos, percebe que o ensaio fotográfico realizado pelo grupo de meninas do Crespxs e Cacheadxs é uma forma de libertar os demais padrões estéticos existentes, e não somente isso. O grupo é formado por meninas que têm em comum o fato de deixarem de alisar os cabelos e usá-los naturais, e para isso enfrentam o preconceito quando assumem a estética afro.

O ensaio foi realizado no dia 26 de abril e reuniu 14 modelos crespas e cacheadas com estilos e personalidade diversas (Ada Fernanda, Carla Galdino, Gabriela Guimarães, Caroline Bento, Kevelin Santos, Jéssica Silva, Larissa Correia, Luanne Lima, Mariana Miranda, Mirla Kleille, Salatyelle Damasceno, Rosilene Rocha, Sarah Quimba, Yasmin Silva,) 2 maquiadoras voluntárias (Rosilene Rocha, Suely Mendes), 2 fotógrafas voluntárias (Maiara Faben, Queila Sousa).

De acordo com Mirla Kleille, de 22 anos, uma das organizadoras e idealizadoras do projeto, ela fica feliz “por saber que a ideia em ser autêntica, e de deixar clara minha identidade afro-brasileira, vai servir também de incentivo a outras pessoas”. Mirla confessa que por muito tempo foi “prisioneira da química”, mas agora está livre, apesar de perceber que “nossa sociedade é preconceituosa, se incomoda com quem foge aos padrões, e nesse caso, aos estéticos”.

Jéssica Silva, de 22 anos, também organizadora e idealizadora do projeto fala que a “estética afro-brasileira precisa ser celebrada como nosso ideal, pois compõem as nossas raízes, acredito no caráter político do grupo e que somos capazes sim de levantar a bandeira e ir a luta independente de tudo que a sociedade nos impõem todos os dias”. Ela coloca ainda que o grupo Crespxs e Cacheadxs nasceu tímido dentro do alcance que tinham, mas pretende continuar travando batalhas, e esse ensaio fotográfico pode ser visto como uma ação da militância do grupo.

A participante do ensaio Luanne Lima, de 21 anos, conta que sua atitude não tem ligação com a estética, “ser cacheada/crespa vai muito além de estética, é assumir uma identidade, é aceitar suas raízes. Não é por “boniteza” ou moda, é pela necessidade de mostrar a sociedade que dá pra ser feliz como é, e que, antes de tudo eu me aceito assim”. Ela ainda ressalta que para quem quer assumir sua identidade afro encarará o preconceito e racismo que na visão dela é eminente.

Luanne deixa uma pergunta que resumi o preconceito sofrido por mulheres negras: “Ruim pra que? Ruim pra quem?”.

Kevelin de Souza Santos, de 23 anos, que também participou do ensaio diz que esse foi um dia descontraído onde pode encontrar outras mulheres que tem algo em comum a ela: “manter o cabelo natural sem a utilização de produtos estéticos para mudar o cabelo”, e a alegria de gostar de “afirmar a genérica afro-brasileira sem receio do que a ditadura da beleza exige”.

Sarah Quimba Pinheiro, de 25 anos, participou do ensaio e, diferente das demais, ela sempre usou o cabelo natural, porém também já sofreu com comentários e conselhos de quem achava melhor que ela alisasse. “Hoje, depois de algumas leituras e discussões, reflito melhor, sobre os comentários e palpites que sempre recebi, e entendo que usar meu cabelo da forma que ele é, ultrapassa a minha identificação enquanto pessoa e “funciona” como afirmação da minha negritude, como afirmação das caraterísticas do negro tão questionadas pela sociedade.  E sei o quanto estar fora do padrão (liso e loiro), incomoda as pessoas, por isso, os comentários e sugestões que me fizeram”, diz Sarah.

As fotógrafas Maiara Faben, de 27 anos, e Queila Sousa da Silva, de 24 anos, compartilham de tal ideia politizada das meninas.

Maiara Faben, fotógrafa

Para Maiara a fotografia é um hobby, mas em relação  ao movimento ela percebe que traz “para nossa cidade o despertar de nossa própria cultura, nossas raízes, ignorando esse padrão de beleza imposto pela sociedade, nos aceitando como somos e sendo felizes com o que temos, nesse caso, nossos poderosos cachos”, conta ela, que também é uma cacheada.

Queila Souza, fotógrafa 

Queila afirma que “O cabelo dessas mulheres além de esteticamente bonito, estão impregnados de uma história reprimida por muito tempo, pelo ideário de beleza de que o liso é o “cabelo bom””. Acompanhar essas meninas e fazer um ensaio foi para ela um momento único, extraordinário, pois ela viu cada passo, como o “abandono dos produtos para alisar, passar pelo doloroso e libertador BC (Big Chop: grande corte), enfrentar olhares maldosos e de curiosidade, e ver os cabelos crescendo de forma natural, sendo aceitos e cuidados de acordo com sua personalidade”.  Queila parabeniza as colegas fotografadas e diz que espera que seu álbum motive outras mulheres.


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