Ex-diretora de presídio teve bebê prematuro que permanece com ela na cela; família denuncia situação de vulnerabilidade

Sete meses após a fuga em massa de 16 detentos do Conjunto Penal de Eunápolis, novas camadas do caso envolvendo a ex-diretora da unidade, Joneuma Silva Neres, vêm à tona. Além das acusações de corrupção e envolvimento com facções criminosas, a situação atual da ex-servidora penitenciária chama a atenção por um fato de grande impacto social: Joneuma deu à luz ainda detida e ainda cumpre prisão preventiva. O bebê, que nasceu prematuro, permanece com ela em uma cela do Conjunto Penal de Itabuna, no sul do estado.
Preservando o direito da convivência entre mãe e filho nos primeiros meses de vida, a legislação brasileira permite que bebês fiquem com as mães detentas até completarem seis meses de idade. No entanto, a família da ex-diretora contesta a adequação do ambiente carcerário para uma criança recém-nascida. “O presídio não é ambiente para uma criança recém-nascida e a família está desesperada, sem ter o que fazer. A gente não tem condições de estar lá com ela, pelo fato de ser uma cidade longe, e não ter recursos financeiros para estar lá”, desabafa a irmã e advogada de Joneuma, Jocelma Neres, em entrevista à TV Bahia.
Joneuma foi presa em 24 de janeiro deste ano, já em estado avançado de gestação. Desde então, permanece sob custódia enquanto responde a um processo que investiga a suposta facilitação da fuga em dezembro de 2024. A operação resultou na saída de 16 presos — até o momento, apenas um deles foi localizado, mas morreu em confronto com a polícia.
De acordo com a denúncia do Ministério Público da Bahia (MP-BA), a ex-diretora teria mantido um relacionamento amoroso com Ednaldo Pereira de Souza, o “Dadá”, um dos detentos que fugiram. Apontado como líder de uma facção criminosa atuante na região e com vínculos com o crime organizado do Rio de Janeiro, Dadá teria recebido diversos privilégios dentro da unidade, inclusive visitas sem inspeção e encontros frequentes e sigilosos com Joneuma em uma sala de videoconferência.
A irmã da ex-diretora nega qualquer envolvimento amoroso entre Joneuma e o detento. “Ela está sofrendo as consequências de um crime que não cometeu. Nunca teve nenhum relacionamento com essa pessoa”, afirma Jocelma, reforçando que a ex-diretora está sendo usada como bode expiatório em uma situação maior e mais complexa.
Outros elementos adicionam contornos políticos à história. Em abril deste ano, Joneuma entrou com um pedido judicial de pensão alimentícia contra o ex-deputado federal Uldurico Alencar Pinto, conhecido como Uldurico Júnior, que ela aponta como pai da criança nascida na prisão. O político, que foi candidato à Prefeitura de Teixeira de Freitas em 2024, era tido como padrinho político da ex-diretora e teria visitado o presídio em diversas ocasiões, segundo depoimentos anexados ao processo.
Um policial penal relatou à Justiça que políticos, incluindo Uldurico, entravam na unidade sem passar por revista, cadastro ou inspeção, o que fugia completamente dos protocolos de segurança da penitenciária. O mesmo agente afirmou que se retirava da unidade sempre que o ex-deputado chegava, por considerar inadequada a presença de figuras políticas em um ambiente sensível e institucional.
Uldurico, por sua vez, nega qualquer envolvimento com facções e afirma estar disposto a realizar o teste de DNA o mais rápido possível.
Além de Joneuma, outras 17 pessoas foram denunciadas pelo MP-BA, incluindo Wellington Oliveira Sousa, ex-coordenador de segurança do presídio e subordinado direto da ex-diretora. Foi ele quem trouxe à tona muitos dos indícios de irregularidades no funcionamento da unidade, revelando, entre outras coisas, o suposto favorecimento a detentos e as decisões arbitrárias que, segundo ele, comprometeram a ordem e a segurança do presídio.
Enquanto o processo avança na Justiça e os desdobramentos do caso seguem em investigação, permanece a preocupação com a criança que compartilha o cárcere com a mãe. O caso suscita discussões urgentes sobre os direitos de bebês nascidos em contexto de privação de liberdade e as responsabilidades do Estado em garantir condições mínimas de dignidade a esses recém-nascidos — cidadãos que, apesar do ambiente em que vivem, ainda não cometeram crime algum.